O desgosto de Robert Civita
A terceira geração da família Civita assumiu de vez o controle do Grupo Abril nesta semana. E, se confirmada a notícia do Estadão, metade da empresa vai ser destruída e uma enorme parcela de jornalistas vai voltar a mendigar emprego num país onde o mesmo escasseia - isto é, o emprego na área de jornalismo.
Não se trata de um movimento isolado. Faz muito tempo que a Abril vem se retirando aos poucos da área editorial - e por extensão da área de comunicações - para sobreviver no "mercado da educação" que lhe garantiria excelentes contratos com governos e permitiria caríssimas mensalidades escolares entrando mensalmente nas contas da empresa. No segundo semestre de 2011, a Abril contratou ninguém menos do que Fábio Barbosa - o homem do "juntos" do Santander - para chefiar uma possível retomada da empresa. Até agora não se viu nenhuma novidade editorial. Pelo visto, o leque de revistas tende apenas a diminuir.
No entanto, o que está para ocorrer é uma negação da própria existência da Abril. A missão da Abril, disponível no site do grupo, diz que seu objetivo básico é "continuar a desenvolver a maior empresa editorial
brasileira, mantendo-a lucrativa, inovativa, integrada e diversificada". Nada disso se fez, busca-se apenas enxugar o negócio, tido como um fardo, para entrar de cabeça na privatização da educação.
É curioso que isso se faça algumas semanas após a morte de Robert (sim, Robert, que é como ele se fazia chamar dentro da empresa) Civita. Robert foi o mais apaixonado dos barões da mídia brasileiros. Falo, evidentemente, dos herdeiros de impérios. Não por acaso foi ele o idealizador de três revistas importantíssimas para a imagem da Abril. “Quero fazer uma revista de informação semanal, como a Time, uma revista de negócios como a Fortune e uma revista como a Playboy”. Isso talvez explique o que se deu com Veja. Obcecado com a revista que ajudou a fazer, Robert não deixou os editores e redatores em paz. Tornou a Veja uma revista ideológica - e depois um detrito sólido de maré baixa. Editores mais sérios teria baixado o tom da revista, mas Robert não os deixava.
Por fim, a Editora Abril, sua mais formidável herança, entrou na rota definitiva do desaparecimento. Do leque de revistas sobram, no máximo, Veja e Exame. Playboy, outra revista por ele idealizada, está marcada pra falir nos próximos meses.
Um fim melancólico de uma empresa falida há muito tempo.
***
A seguir, considerações feitas por Paulo Henrique Amorim por ocasião da compra do Anglo pela família Civita.
Saiu no Valor:
A família Civita (e não a Editora Abril) comprou a Anglo, que produz apostilas e ensina a fazer concurso público.
Por que foi a família Civita e não a Abril ?
Essa é uma pergunta muito complexa.
Decidi recorrer ao David Ogilvy, um mestre da publicidade.
(Clique aqui para ler “A Globo pode calar a boca do Galvão antes de 2014”)
- Por que foi a família Civita e não a Abril, perguntei, assim de lata.
- Porque a família está caindo fora do negócio de revistas – respondeu David, na lata.
- A família Civita vai sair do negócio de revistas ?, perguntei incrédulo. O que diria disso o Victor Civita ?
- Primeiro, que não se controla a descendência, meu filho – filosofou o David.
- Sim, vamos sair da genética e voltar ao PiG (*). Quer dizer, então, que a família Civita vai sair do ramo de revistas ?
- Claro. O negócio murcha.
- Não sobra ninguém ?
- Sim, sobram as revistas de nicho. Ou de grife, como a Economist e a Carta Capital. O resto … dança.
- E a Veja não é uma grife ?
- Como diz você, o Roberto deixou que transformassem a Veja em detrito de maré baixa.
- Roberto ou Robert ?
- Como você preferir.
- Então ele vai fechar a Veja ?
- Não. A Veja vai ser um canhão. Vai ser usada politicamente.
- E por que a Anglo ?
- A Anglo na verdade é um franchising. Ela licencia sistema de aprendizado sob a forma de apostilas e serviços para quem quer fazer concurso público.
- Ela vende ao Governo ?
- Vende a todo mundo, inclusive a governos municipais e estaduais.
- Mas, esse negócio de vender material impresso não é uma gelada ?
- Claro !
- Daqui a pouco vem a banda larga e que estudante vai ler material impresso?
- Meu caro, o Roberto foi para a tevê a cabo e para a internet. Vendeu a TVA e o Luizinho Frias engoliu ele no UOL. O Roberto não acertou uma tecnologia, fora da que o Seu Victor deixou: fazer revistas.
- E quais são os planos da família Civita para a Anglo ?
- Daqui a pouco eles fazem um IPO. Os sócios antigos caem fora e eles botam dinheiro para dentro.
- E quem vai fazer isso tudo ? O Robert – quer dizer, o Roberto ?
- Não, ele chamou o Manoel Amorim, que era do Ponto Frio.
- Ele não foi da Telefônica, também ?
- Sim, você tem boa memória, rapaz.
- E não foi ele quem levou a Telefônica a comprar a TVA da Abril e dar oxigênio à Abril ?
- Uma mão lava a outra, não é isso ? – sorriu o David, enigmaticamente.
Pano rápido.
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